Uma vez, uma terapeuta me disse que livros de autoajuda só ajudam quem os escreve, afinal, é quem vende que sai ganhando. Na época, achei aquilo meio radical, quase cínico demais. Mas recentemente resolvi me aventurar por alguns desses livros, até os mais poéticos, os que prometem curar feridas sem sequer nomeá-las. O problema é que, no fim, muitos deles soam dramáticos demais, maçantes demais, demasiadamente certos de verdades que não me servem. Ou talvez eu é que seja um terreno árido demais pra esse tipo de semente.
O que eu sei é que existe uma dor que ninguém me ensinou a decifrar. Uma dor que eu gostaria de folhear como quem procura uma explicação em índice alfabético. E ela tem nome, embora eu tente disfarçar com metáforas porque dizer “ciúme” é simples demais para algo que me atravessa tão profundamente. É um incêndio silencioso, desses que começam na beirada de um papel e, quando a gente finalmente percebe, já consumiram metade da página.
Saber do que vocês viveram, você e ele, me corrói num lugar que eu não sabia que existia. É como caminhar por um jardim onde cada flor tem o mesmo perfume, mas nenhuma nasceu pra mim. E por mais que eu tente não olhar, não imaginar, não reconstruir cenas que não me pertencem, a mente teima em acender fósforos num campo seco. Não preciso nem de detalhes; o simples fato de existir um “antes de mim” às vezes já me corta a respiração.
E dói porque eu queria ter estado lá. Queria ter sido eu naquele tempo, naquela história, naquele lugar onde sua vida tocou a de outra pessoa. Mas, ao mesmo tempo, fico feliz, genuinamente feliz, porque hoje você me passa uma segurança tão tranquila, um carinho tão inteiro, uma certeza tão serena de que sou eu quem ocupa seus pensamentos agora. E eu vejo isso nos seus olhos, de um jeito tão sincero que me desarma. Então, quando descubro fragmentos do passado, mesmo sem querer, é como se eu me visse observando de fora a vida que eu gostaria de ter vivido ao seu lado, enquanto também reconheço que, no fim, eu cheguei no momento certo: no momento em que você me escolhe, de verdade.
Na atual conjuntura, evito saber do seu passado, não porque desconfio de você, mas porque cada peça dessa arqueologia emocional me fere. E fere porque eu sei, lá no fundo, que eu jamais teria te deixado ir, jamais teria ferido você, jamais teria te trocado por nada. O que me machuca não é o que houve entre vocês, mas o fato de eu não ter estado ali. É o fantasma de uma história onde eu não existia, mas que ainda ocupa espaço de alguma forma, mesmo que irrelevante no presente.
E tem dias em que esse sentimento é só um arranhão discreto. Em outros, é uma ferrugem emocional que corrói devagar, sem aviso, e me deixa inquieto, pequeno, ansioso. Eu sei que é irracional, quase pueril, mas também sei que é real. E, como toda coisa real, não basta ignorar. Preciso aprender a conviver com esse metal quente dentro de mim sem deixá-lo me derreter.
Então eu sigo tentando. Tentando respirar, tentando desfazer a comparação que não pedi pra fazer, tentando lembrar que o agora é o terreno onde eu realmente posso viver com você. Tentando transformar esse ciúme corrosivo em algo menos afiado, mais compreensível, mais meu. O importante é não deixar de florescer. Sem medo, sem desconfianças. Acreditar que o passado não pode interferir no presente, mas o presente interfere no futuro. E é lá onde eu quero e vou estar com você.
No fim, esse texto não é autoajuda, e muito menos cura. É só o que eu consigo escrever enquanto ainda aprendo a lidar com a chama que arde, mas não me queima por completo. Talvez seja só o meu jeito torto de dizer que eu te amo tanto que até o que veio antes de mim dói, mas que, mesmo assim, eu escolho ficar, escolher você, e aprender a cuidar dos jardins para que ele floresça cada vez mais lindo para que nossas duas borboletas feridas aprendam a voar em conjunto.

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